FONTE: iG Minas Gerais - Mariana Alencar, TRIBUNA DA BAHIA.
Medo de se expor, de perder o emprego e a dificuldade de recolher provas contundentes são as principais causas do silêncio em relação às agressões de cunho sexual. No país, apenas 10% das mulheres teriam coragem de denunciar.
Piadas
aparentemente inofensivas, comentários desagradáveis, pedidos que vão além da
função para o cargo, acúmulo de afazeres. Cantadas ou insinuações constantes,
de cunho sensual ou sexual, sem que a vítima as deseje, realizadas de forma
explícita ou sutil.
Todas
essas ações acontecem frequentemente em ambientes de trabalho com vítimas que
são, na maioria dos casos, mulheres. No passado, acreditava-se que a mulher
tinha nascido para servir ao sexo oposto e a ele se submeter.
As
diferenças de gênero no plano social, marcadas por costumes herdados de
civilizações antigas, continuam presentes na atualidade.
Com a
entrada da mulher no mercado de trabalho, vários aspectos dessa discriminação
ainda se manifestam, e de forma cruel: não bastassem os menores salários
recebidos pelas mulheres, não é incomum o ato de sofrer qualquer tipo de
assédio nesse ambiente.
Recentemente,
a Ipsos – terceira maior empresa de pesquisa e de inteligência de mercado do
mundo –, realizou um levantamento global sobre os problemas enfrentados pelas
mulheres no ambiente do trabalho.
Foram
ouvidas cerca de 500 delas nos países integrantes do G-20 (as 19 economias mais
desenvolvidas do mundo e a União Europeia), todas inseridas no mercado de
trabalho.
Os
dados divulgados mostraram que, no Brasil, 36% já sofreram assédio. Nesse
universo, apenas 10% afirmaram que teriam coragem de relatar o caso e denunciar
os agressores.
Denúncia x provas.
Apesar
da facilidade de realizar uma denúncia, 90% das mulheres não têm coragem de
relatar o caso, de acordo com a Ipsos. Isso acontece devido à dificuldade de
recolher provas relacionadas aos abusos – em sua maioria comentários e
propostas feitos informalmente, como conversas “de corredor” –, ao medo de se
expor e, claro, de perder o emprego.
É o
caso da bancária Mariana de Albuquerque. Ela conta que trabalhava em uma
agência pequena e que era a única funcionária mulher. O gerente de negócios da
unidade, cotidianamente, dirigia a ela palavras grosseiras relacionadas a sexo.
“Esse
comportamento foi minando minha autoestima. Fui me deprimindo e acabei sendo
afastada do trabalho por 120 dias. O gerente espalhou na agência que eu queria
ter relações sexuais com ele, mas, como ele não me quis, eu acabei ficando
deprimida”, relata.
Na
ocasião, ela não procurou a Polícia Civil para denunciar o caso – entretanto, o
sindicato da categoria foi acionado, e o gerente foi transferido para outra
agência.
O
artigo 216 do Código Penal define que assédio é “constranger alguém com o
intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da
sua condição de superior hierárquico”.
Mas o
presidente da Comissão de Assuntos Penitenciários da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB-MG), Anderson Marques, explica que, para denunciar, é preciso ter
provas que certifiquem a veracidade do depoimento da vítima.
“É
preciso que a mulher conte com testemunhas, por exemplo. É importante recolher
e-mails, mensagens de celular, gravação telefônica ou qualquer outro registro”.
Ele explica que, para denunciar, é preciso procurar a Polícia Civil.
Em
seguida, o delegado envia o caso ao Ministério Público, que segue com o
processo. “A vítima tem até seis meses para fazer a denúncia. É a melhor
maneira para acabar com esse tipo de conduta. As mulheres tendem a ficar
caladas por medo, mas isso precisa mudar”, defende.
Dano moral: outro problema recorrente em ambientes
corporativos
De
acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o assédio moral
acontece quando há a exposição dos trabalhadores a situações humilhantes e
constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no
exercício das suas funções.
O presidente
da Comissão de Assuntos Penitenciários da OAB-MG, Anderson Marques, explica que
tanto homens quanto mulheres estão suscetíveis a sofrer assédio moral, mas que
esse tipo de perseguição acontece mais com as mulheres.
“A
sociedade a vê como subordinada. É mais comum que elas sofram com esse tipo de
assédio”, revela. Foi o que aconteceu com a estudante Gabriela Silva (nome
fictício).
Aos 16
anos, ela estava contratada como “pequena aprendiz” em uma empresa terceirizada
que prestava serviços a um órgão público do Estado.
Na
época, era obrigada a realizar atividades que iam além das suas funções e que
eram recorrentes, como fazer café, pagar contas pessoais da chefia, levar
óculos e outros objetos para fora da empresa e comprar lanches, entre outras
coisas.
Como
essas atividades acabavam tomando o tempo da estudante, ela começou a receber
críticas por não realizar o seu trabalho da melhor maneira possível. Depois de
uma série de abusos, Gabriela foi responsabilizada pelo sumiço de um documento
importante.
Ao tentar
se defender das acusações, foi dito à garota que ela estava com “problemas
psicológicos comuns aos adolescentes”. “O que me indignava era o fato de que
nunca havia feito nada para receber tal tratamento, tanto que em meu setor
todos ficavam chocados com essas atitudes”, lamenta.
Gabriela
diz que desistiu de denunciar os abusos por se sentir impotente diante da
situação. “Cheguei a falar dos abusos com a pessoa que era hierarquicamente
superior à minha chefe, mas nada foi feito”.
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