FONTE: *** Jairo Bouer, https://doutorjairo.blogosfera.uol.com.br
Vivemos em uma época de
recompensas instantâneas, como informações em tempo real, videogames, likes nas
redes sociais. Ninguém mais suporta ficar em algum lugar parado, sem usar o
smartphone, e muita gente fica irritada quando alguém demora para responder seu
e-mail ou mensagem de texto. Essa mudança radical de comportamento dos últimos
anos causa preocupação, e não faltam especialistas para alertar sobre as
consequências graves que isso pode trazer para as crianças no futuro.
Um estudo realizado por
psicólogos da Universidade de Stanford nos anos de 1960 foi uma das pedras
fundamentais da teoria de que saber esperar por uma recompensa é uma virtude
que aumenta as chances de uma criança ser bem-sucedida no futuro. O chamado
“teste do marshmallow” era muito simples: crianças norte-americanas de 3 a 5
anos eram expostas a um marshmallow e ouviam que, se vencessem a tentação de
comer o doce na hora e esperassem dez minutos, poderiam ter dois marshmallows
em vez de apenas um.
Os pesquisadores, na
época, associaram a capacidade de adiar uma gratificação na infância a
resultados positivos na adolescência e mais tarde, como melhor desempenho
acadêmico, peso mais saudável, habilidade de lidar com estresse e frustração,
responsabilidade social e bom relacionamento com pares. Isso foi confirmado nos
estudos de acompanhamento realizados anos depois. Faz todo sentido: quem
consegue vencer o impulso de comer a guloseima preferida pode ter mais força de
vontade para seguir uma dieta, ou até economizar mais dinheiro para o futuro.
Mas dois estudos
recentes trazem novos dados que podem colocar em xeque muitas das crenças
geradas pelo “teste do marshmallow”. Um deles foi divulgado esta semana pela
Associação Americana de Psicologia e traz uma informação bombástica: as
crianças de hoje podem ter mais autocontrole do que as de gerações anteriores.
Pesquisadores das
universidades de Minnessota e de Washington compararam os resultados do “teste
do marshmallow” original e as réplicas realizadas nos anos de 1980 e no início
do ano 2000. Contrariando todas as expectativas, as crianças do experimento
mais recente conseguiram esperar dois minutos a mais que as do primeiro.
Para os pesquisadores,
o fato de os norte-americanos entrarem na escola muito mais cedo hoje em dia
pode estar por trás dos resultados. A mesma equipe realizou uma pesquisa online
com 358 adultos e 72% achavam que as crianças de hoje esperariam muito menos.
Como os autores ressaltam, é preciso tomar cuidado com conclusões precipitadas
que não têm embasamento científico.
Outra pesquisa,
publicada no início do mês por uma equipe das universidades de Nova York e da
Califórnia, foi uma versão mais ampla do estudo antigo do marshmallow e contou
com 900 crianças de diferentes realidades socioeconômicas. O trabalho original,
da Universidade de Stanford, tinha menos de 50, e as crianças eram parentes dos
funcionários da faculdade, ou seja, não era uma população variada.
A nova versão do teste,
publicada no periódico Psychological Science, mostrou que adiar a gratificação
trouxe benefício, mas ele não foi tão grande assim. E mais: o efeito diminuiu
quando os jovens atingiram 15 anos. Nesse ponto, o que pareceu ter mais
importância foi o nível de educação das mães dos participantes. Quando a mãe
tinha pouco estudo, o filho não se saía melhor se tivesse esperado mais na
infância.
Segundo especialistas
ouvidos pelo jornal The Atlantic, isso sugere que algumas crianças podem não
conseguir esperar por um doce maior porque vêm de um contexto com menos
recursos. Para eles, condições socioeconômicas mais favoráveis podem interferir
no autocontrole. E esses mesmos fatores podem ter mais relação com o sucesso
futuro do que a capacidade de esperar por uma recompensa maior.
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