segunda-feira, 30 de novembro de 2009

ÁGUA NO SEMIÁRIDO...

FONTE: TRIBUNA DA BAHIA.
A zona rural de Nova Soure, a 193 quilômetros de Salvador, era até recentemente um exemplo dos contrastes da realidade brasileira. Embora exista muita água na região, boa parte da população não dispunha do recurso para suprir as necessidades mais elementares. Dentro do município, lugares como Carrapichinho, Cauê e Coité eram um triste retrato dessa situação. Distantes cerca de 500 metros das margens do rio Itapicuru, a disponibilidade hídrica vista ali na superfície não era menor do que a existente no subsolo, de grande potencial. Apesar disso, o fornecimento regular de água aos moradores não existia. Se sobrava água de um lado, faltava vontade pública do outro.
Em 1987, um poço perfurado em Cauê comprovou o potencial do subsolo. A força do lençol freático fez jorrar água na superfície para deleite dos moradores e visitantes que dia e noite passaram a tomar banhos no local. Nos finais de semana a frequência aumentou, o que levou, um ano depois, o governo a atender à reivindicação dos moradores e implantar um pequeno balneário, que, logo em seguida, ganhou um bar com mesas de bilhar. De piscina natural à sombra dos cajueiros, o local, a partir de 2009, mudou de foco e passou a abrigar também uma casa de bombeamento e tratamento de água e dois reservatórios para o produto, que era abundante. O conjunto mudou a vida do local, pois o modesto aparato de engenharia hídrica implementado pelo governo do Estado, através do programa Água para Todos, introduziu uma palavra-chave na região: distribuição.
Desde então, as águas do poço são compartilhadas por todos, servindo tanto ao lazer quanto às necessidades cotidianas. O banho de cascata foi mantido - entre 9 e 16 horas. Porém, no início de cada manhã e no final da tarde um operador local, remunerado pela Prefeitura de Nova Soure, direciona a água para tratamento (desinfecção). Bombeada, a água percorre os 812 metros de adutora até os dois reservatórios, de 20 mil litros cada. Daí segue, pelos 8 mil metros da rede de distribuição, até as moradias. Para as mais distantes foram criados quatro chafarizes. Implantado pela Cerb, empresa do governo do Estado, ao custo de R$ 110 mil, o Sistema Integrado de Abastecimento de Água atende os 600 moradores atuais, mas foi projetado para 20 anos, podendo beneficiar 1.200 pessoas.
MUDANÇA DE CENÁRIO.
Soluções como a dessas localidades em Nova Soure estão mudando o cenário do semiárido baiano. Até setembro de 2009, por exemplo, já tinham sido construídas 28 barragens, perfurados 1.496 poços, instaladas 35 mil cisternas, implementados 902 sistemas de água, entre simplificados, convencionais e integrados, recuperados ou ampliados 400 sistemas e realizadas 287 mil ligações. Além disso, foram construídos 35 sistemas de esgotamento, realizadas 122 mil novas ligações de esgoto e 13 mil obras de melhoria em sanitários domiciliares.
Incorporando soluções tecnológicas avançadas e resguardando a sustentabilidade ambiental, as obras do Programa Água para Todos já absorveram R$ 401 milhões dos governos estadual e federal e permitiram que mais de 2,3 milhões de baianos passassem a ter acesso a água e esgoto. Grandes, médias e de pequeno porte, distribuídas por todo o território baiano, as intervenções evidenciam a capilaridade do programa, que contempla desde a metrópole Salvador até longínquas comunidades rurais, habitadas por algumas poucas dezenas de famílias - onde até então prevaleciam a extrema carência de recursos e a ausência do Estado.
Na casa de Rosineide Oliveira, 39 anos, a água canalizada e tratada entra hoje através de três torneiras – uma na pia da cozinha, outra no lavatório e a terceira no tanque. No banheiro, flui através do chuveiro e da descarga. Um simples giro da torneira ou um puxão na descarga e a família dispõe de água a qualquer hora. Ela, o marido e os três filhos têm agora a tranquilidade de saber que não vai faltar água e a comodidade de não ter que ir buscá-la.
COMUNIDADE FAZ MUTIRÃO.
Realizada com a participação da comunidade, organizada em mutirão, em apenas seis meses a obra já mudou a vida do lugar. Acabou-se o bate-estaca no chão duro para localizar um manancial, muitas vezes de água salobra. Acabou-se a rotina de puxar baldes até a superfície e carregá-los até as caixas d´água no alto das casas. Bastou um pequeno investimento em tubos e uma conexão à rede para mudar o ambiente doméstico. Resultado: mais higiene, mais conforto e mais tempo para o trabalho, para a família, para o descanso, para o lazer, para o estudo, para a devoção, para a saúde e para tantas outras coisas.
Para Rosineide, sobrou mais tempo para cuidar da casa e da família, ajudar na roça e se concentrar nos estudos da 6ª série do EJA - Educação de Jovens e Adultos, também um programa do governo do Estado, que cursa à noite, em Nova Soure. Sobrou tempo para se dedicar às atividades comunitárias da Associação dos Pequenos Produtores Rurais da Comunidade Fazenda Cauê. Restou energia, ainda, para as atividades religiosas, como responsável pela Igreja do Sagrado Coração de Jesus. Agora os moradores estão empenhados em transformar a condição da igreja, onde acontecem não somente as missas, no primeiro sábado de cada mês, e as catequeses dos homens e das crianças, mas também as reuniões comunitárias. Com o dinheiro do ofertório e com o adjutório de todos, eles conseguiram comprar a tubulação e o material para instalar um banheiro no espaço.
A transição de uma condição anterior, de privação, para o atual estado de satisfação deixou como legados o fortalecimento do espírito comunitário e a valorização ainda maior da água como bem vital, como expõe Rosineide: “Foi uma bênção Já tínhamos a bênção de ter água na região; agora temos água corrente e tratada. Por isso, quando alguém desperdiça, a gente vai lá e reclama. A água é da nossa comunidade. Cada pingo de água que perdemos é um pingo de nosso suor",afirma.

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