FONTE: Jan Hoffman, The New York Times (noticias.uol.com.br).
Bem a tempo de
proteger os pacientes dos perigos do excesso de alegria no fim do ano, uma nova
revisão de pesquisas acadêmicas publicada em uma revista médica britânica
descreve os efeitos negativos da risada.
Entre os alertas
divulgados: a força do riso pode deslocar mandíbulas, propiciar o surgimento de
hérnias e causar ataques de asma e dor de cabeça. As risadas podem causar
arritmia cardíaca, desmaios e enfisema (esse último, de acordo com um estudo
publicado em 1892).
Além disso, a risada
pode causar as síndromes raras e perigosas como a de Pilgaard-Dahl e de
Boerhaave (veja as explicações abaixo). E não se esqueça do impacto
aterrorizante do riso prolongado no trato urinário (detalhado em um artigo
publicado pela Lancet em 1982, intitulado "Giggle
Incontinence", ou Incontinência do Riso, em tradução literal).
Na pior das
hipóteses, a nova revisão pode ser uma boa notícia para quem vive de cara
fechada. Se 2013 foi o ano dos hipocondríacos, os autores do estudo dão a
entender que 2014 será o ano dos pacientes saudáveis de mau humor.
Revisão.
A análise, intitulada
"Laughter and Mirth (Methodical Investigation of Risibility, Therapeutic
and Harmful)" (O riso e a investigação metódica da risada terapêutica e
prejudicial, em tradução livre), recorreu a cerca de 5.000 estudos. Ela foi
publicada na revista BMJ, antigamente conhecida como The British Medical
Journal, que publica há muito tempo artigos com pesquisas minuciosas sobre
assuntos divertidos nas edições de fim de ano. O subeditor da revista, Tony
Delamothe, afirmou que o estudo foi revisado por pares – provavelmente por um
médico com o senso de humor cuidadosamente controlado.
Este ano, a edição de
Natal também inclui os artigos: "Were James Bond's drinks shaken because
of alcohol induced tremor?" (Os drinques de James Bond eram batidos por
conta de tremores causados pelo alcoolismo?), "The survival time of
chocolates on hospital wards: covert observational study" (O tempo de
sobrevivência dos chocolates nas alas hospitalares: um estudo observacional
secreto), e "Operating room safety: the 10 point plan to safe
flinging" (Segurança na sala de operação: um plano em 10 passos para um
arremesso seguro), que apresentava precauções como: "Antes de arremessar,
identifique o alvo e a área atrás dele", e "nunca arremesse um
instrumento para o alto".
Na primavera passada,
os coautores do estudo, Robin E. Ferner, professor honorário de
farmacologia clínica na Universidade de Birmingham, e Jeffrey K. Aronson,
associado de farmacologia clínica em Oxford, especializado no estudo dos
benefícios e malefícios de remédios, conversaram sobre qual relação de dano e
benefício poderiam explorar para conseguir a vaga disputada na capa da edição
de Natal da BMJ. De acordo com Delamothe, o BMJ recebe quase 120 artigos e
aceita em torno de 30.
Ferner e Aronson
pensaram em alimentos de fim de ano, por exemplo, mas suas preferências eram
muito diferentes. "Ele gosta de vinhos doces, eu prefiro os secos",
explicou Ferner. Então os dois encontraram uma causa em comum, "já que nós
dois gostamos de um humor sardônico".
Eles limitaram os
artigos que mencionam o riso a um total de 785, colocando-os em três
categorias: benefícios (85), danos (114) e condições que causam riso crônico
(586).
A questão chegou em
boa hora, argumentaram, já que o BMJ não havia abordado o riso de forma séria
há mais de um século. Em 1898, a revista havia publicado o estudo de caso do
ataque cardíaco de uma menina de 13 que riu por tempo demais. No ano seguinte,
o problema do riso foi levantado novamente quando o autor de um editorial
escreveu em resposta à sugestão de um médico italiano de que as piadas poderiam
ser usadas como tratamento para a bronquite, propondo um o termo
"gelototerapia". (Gelos era o deus grego do riso; em italiano, gelato
significa sorvete.)
Demorou até que o
riso ganhasse força como terapia: Em 1928, a revista científica The Journal
of the American Medical Association deu pouca atenção ao livro de James J.
Walsh, "Laughter and Health" (Riso e saúde, em tradução livre).
Os danos, no entanto,
foram observados com atenção. Uma discussão publicada em 1997 sobre a síndrome
de Boerhaave, uma perfuração espontânea do esôfago, um evento raro e
potencialmente letal, mencionou ser o riso uma de suas causas comuns.
Além disso, existe
também a misteriosa síndrome de Pilgaard-Dahl, identificada em um artigo de
2010 como um pneumotórax induzido pelo riso que afeta homens fumantes de meia
idade. O nome é uma homenagem aos comediantes dinamarqueses Ulf Pilgaard e
Lisbet Dahl.
"Não acredito
que dinamarqueses sejam terrivelmente engraçados e depois de assistir algumas
de suas apresentações no YouTube, continuo sem acreditar, embora eu obviamente
não fale dinamarquês", afirmou Ferner.
Existem outras
ameaças respiratórias causadas pelo riso, afirmou. A ruptura dos alvéolos
(pequenos sacos de ar dentro do pulmão, que geralmente contem cerca de 600
milhões cada): "Se você fizer uma pessoa asmática rir com vontade é melhor
que eles estejam com um inalador ao lado", afirmou Ferner. (Isso com base
em 1936 experimentos em torno do mecanismo do riso em pessoas asmáticas.)
Além disso, há o
perigo de engasgamento, como durante a ingestão de alimentos durante risadas
intensas.
Custo-benefício.
A análise adotou uma
abordagem equilibrada e de custo-benefício em relação ao riso, dando destaque
às vastas evidências de seus efeitos salutares. Concluiu-se com ela que os benefícios
do riso incluem a diminuição da raiva, da ansiedade e do estresse; uma queda na
tensão cardiovascular, na concentração de açúcar no sangue e no risco de
infarto do miocárdio. "O equilíbrio entre os benefícios e os danos é
provavelmente favorável", afirmam os autores.
Estudos recentes
concluíram que o riso "reduz a arteriosclerose" e "melhora a
função endotelial". Além disso, um estudo realizado em 2008 com pacientes
portadores de doenças pulmonares obstrutivas crônicas concluiu que o riso
inspirado pelo palhaço Pello ajudava a melhorar a função pulmonar.
A ajuda de palhaços
foi observada e adotada pela medicina, mas um estudo deixou Ferner de queixo
caído. Um estudo de fertilidade realizado em 2011 relatou que quando um palhaço
vestido de chef de cozinha divertia as candidatas a mamães por 12 a 15 minutos
depois da fertilização in vitro e da transferência dos embriões, a taxa de
fecundidade era de 36%, se comparada aos 20% entre o grupo de controle que não
foi animado pelo palhaço.
"Por que um chef
de cozinha?", questionou Ferner sem entender.
Apesar dessa
observação ampla da literatura médica sobre o riso, Ferner sentiu que ainda
havia um território mal explorado. "Não sabemos até que ponto o riso é
seguro. Provavelmente existe uma curva em forma de U: o riso é bom para você,
mas em quantidade extrema ele talvez faça mal. Mas isso não chega a ser um
problema na Inglaterra", afirmou.
Ainda assim, se você
deseja acompanhar a análise do riso ou outros estudos publicados nas edições de
Natal da BMJ, o risco de uma crise de riso – desde risadinhas, a suspiros e
gargalhadas – pode ser perigosamente alto. Não diga que não avisamos.
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