A coorte (grupo de
indivíduos acompanhado no tempo) mais antiga do Brasil completou 40 anos. Neste
mês, ocorreu um simpósio comemorativo da data. O estudo, pertencente ao
conjunto de trabalhos relativos aos nascidos em Ribeirão Preto no ano de 1979,
foi publicado recentemente no American Journal of Epidemiology. No ensaio, foi
demonstrada a associação entre o parto cesáreo ao nascer e a hipertensão quando
adulto.
Aqueles que nascem por
cesariana têm uma chance 50% maior de virem a se tornar hipertensos aos 25 anos
de idade. Isto é, a probabilidade de ter pressão sanguínea alta nessa faixa
etária cresce de 8% para 12%. O grupo de pesquisas, liderado pelo professor
Marco Antonio Barbieri, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), foi
um dos primeiros do mundo a relacionar o procedimento cirúrgico com a maior
chance de obesidade tardia e agora está na vanguarda novamente.
"Organização
Mundial da Saúde sugere que no máximo 15% dos partos sejam cesáreos. No Brasil,
esse número chega a 55%. Em convênios, a taxa passa dos 80%. Essas estatísticas
apontam que há algo de errado", diz o professor da Faculdade de Medicina
(FM), Alexandre Archanjo Ferraro, ao Jornal da USP no Ar. O País tem a segunda
maior porcentagem de cesáreas no mundo.
A hipertensão é uma das
características mais importantes na origem do infarto cardíaco e do AVC.
"O parto normal é fruto de milhões de anos de evolução. A tecnologia
permitiu outra forma de nascimento, mas se paga um pedágio", argumenta o
médico.
Os pesquisadores
demonstraram a existência do fenômeno, embora ainda busquem o mecanismo
responsável por essa programação, que pode durar por décadas. Ferraro ressalta
que a afirmativa dos médicos "não é determinista, porém probabilística",
e propõe duas hipóteses para o ocorrido.
A diferença entre as
microbiotas intestinais do bebê, causando uma grande alteração do equilíbrio do
organismo, uma vez que o corpo humano, segundo ele, é um grande ecossistema.
"No parto natural, o recém-nascido já tem sua flora intestinal colonizada
ao entrar em contato com o canal vaginal da mãe. No cirúrgico, a primeira
interação da criança se dá com as bactérias do hospital", explica. Outra
possibilidade seria o choque hormonal causado pelo parto normal. "Acontece
uma grande pressão fisiológica sobre o eixo hipotálamo, hipófise e (glândula)
adrenal", diz.
Ferraro relata os
desafios de realizar uma pesquisa do tipo. "Enquanto se pode fazer várias
perguntas de pesquisa a uma coorte, dado às várias informações disponíveis,
existe também o trabalho de acompanhar as pessoas do grupo de perto. Algumas
falecem, outras se mudam." Salvo que os cientistas têm de eliminar de um a
um os outros possíveis responsáveis pela doença. "O tamanho do bebê, por
exemplo, é associado ao parto cesáreo.
A maior chance de
hipertensão não se daria por esse indivíduo se tornar um adulto grande? Outros
fatores, como aleitamento materno e condições socioeconômicas, foram
considerados. No fim, comprovou-se a relação direta da pressão sanguínea alta
com o procedimento cirúrgico", conta. É um trabalho criterioso e demorado.
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