Agressão, assédio,
problemas de relacionamento e financeiros. Consumir bebidas alcoólicas em
excesso afeta o indivíduo e também as pessoas de sua convivência. Foi o que
mostrou um estudo recém-publicado no periódico científico Journal of Studies on
Alcohol and Drugs. O trabalho obteve dados de duas pesquisas realizadas nos
Estados Unidos. Ao todo, foram ouvidos por volta de nove mil adultos. Os
resultados revelaram que 21% das mulheres e 23% dos homens sofreram algum tipo
de dano causado pela bebedeira de alguém. Ao todo, estima-se que um em cada
cinco americanos, ou 53 milhões de pessoas, passam por esse tipo de situação.
"O interessante
deste estudo é colocar em foco justamente as pessoas que sofrem com a ingestão
alcoólica de terceiros, ao invés do grande consumidor", comenta o
psiquiatra André Felipe Castro Ferreira Martins, do Hospital Israelita Albert
Einstein, em São Paulo. É possível assim ter uma ideia de que os problemas
relacionados à ingestão excessiva vão muito além da esfera individual.
Comportamentos de risco, como dirigir embriagado e violência doméstica, atingem
outras vítimas. "Sem falar que um paciente com dependência de álcool
frequentemente terá problemas no trabalho, como baixo desempenho e necessidade
de afastamentos."
Apesar de a pesquisa
ter sido feita nos Estados Unidos, o quadro é parecido entre a população
brasileira. "No Brasil, cerca de 70% dos homens declaram consumir álcool.
Quase 25% declaram que bebem e dirigem", revela Castro. "Os estudos
que focam especificamente nos transtornos da substância a terceiros ainda são
poucos, mas podemos estimar que esse número é grande."
As consequências variam
de acordo com o gênero. Entre os homens, por exemplo, houve mais registro de
agressão física. Entre as mulheres, problemas familiares e financeiros. Por que
ocorre esse corte por gênero? "Sabemos que os homens em geral têm mais
problemas com álcool do que as mulheres", diz o psiquiatra. Muitos deles,
por sua vez, moram com mulheres, esposas e mães que lidam e sofrem diariamente
com essa questão.
Homens também são mais
propensos a praticar binge drinking, fenômeno caracterizado pela ingestão de
grande quantidade de álcool em pouco tempo. O comportamento está ligado ao
envolvimento em situações de risco, como dirigir embriagado e prática sexual
sem proteção.
Consequências
no trânsito.
"Estudos recentes
apontam o Brasil como quinto país no mundo com mais mortes relacionadas a
acidentes de trânsito", diz Castro. São 40 mil mortes por ano e 150 mil
pessoas seriamente feridas. "Se pensarmos que muitos desses acidentes
possuem relação com o consumo indevido de álcool e direção, temos um problema
de saúde pública."
Pesa também o fato de o
álcool não ser visto como uma substância que leva à dependência. "Muitas
pessoas ainda o enxergam como uma droga menos danosa pelo fato de ser
legalizado", diz André Felipe. Ele cita um estudo publicado recentemente
no periódico científico The Lancet que classifica o álcool como a droga mais
perigosa de todas, justamente porque, além de causar muitos problemas de saúde
para os usuários, está envolvida em transtornos para terceiros e para a
comunidade como um todo.
"Sabemos que
intervenções precoces são necessárias", diz Castro. "Quanto mais cedo
uma pessoa começa a beber, mais risco vai ter tanto de desenvolver uma
dependência de álcool, como de se envolver em padrões de consumo nocivos para a
saúde." Segundo o psiquiatra, é importante que seja feita fiscalização
adequada para inibir o consumo de bebidas alcoólicas entre menores de idade e,
desde cedo, abordar esse assunto em casa e nas escolas.
Isso não quer dizer que
a cerveja ou vinho devam ser banidos do dia a dia das pessoas. "É possível
regulamentar sem proibir", fala Castro. "Existem festas hoje em dia
que fazem acordos com empresas de táxi ou aplicativos de transporte privado
para incentivar as pessoas a não irem de carro". Outra saída que vem sendo
muito discutida, conta o psiquiatra, é a proibição de festas open bar, que
estimulam o consumo em binge. Isso aumenta o risco de confrontos físicos e de
dirigir embriagado. "Não há solução perfeita, o importante é adequar
estratégias à realidade de cada população", finaliza.
Nenhum comentário:
Postar um comentário