FONTE: , Ricardo Senra - Da BBC Brasil em Washington ,(http://noticias.uol.com.br).
Uma empresa de
tecnologia de Wisconsin, nos Estados Unidos, causou furor ao anunciar que
implantaria chips no corpo de seus funcionários para substituir crachás, chaves
e a necessidade de senhas em computadores e equipamentos eletrônicos.
Um mês após o
anúncio, passado o frenesi inicial da imprensa americana, 61 dos 80 funcionários
da Three Square Market já convivem com esse corpo estranho, do tamanho de um
grão de arroz, aplicado com uma seringa sob a pele entre os dedos polegar e
indicador.
O chip funciona como
um código de barras e permite que leitores digitais identifiquem o nome, a área
de trabalho e até mesmo o cartão de crédito dos funcionários que decidem
comprar algo para lanchar na cantina da empresa.
"A adesão foi
totalmente voluntária. Eu mesmo me surpreendi com o interesse. A moral da
história é que somos uma empresa de tecnologia e os funcionários naturalmente
se interessam pelo que é novo", disse à BBC Brasil Todd Westby, CEO da
Three Square Market, que era conhecida até hoje como produtora de máquinas de
autoatendimento, como aquelas que vendem latinhas de Coca-Cola no metrô ou
substituem o trabalho dos operadores de caixas em supermercados.
Tratada por Westby
como o início de uma "revolução como foi a do iPhone", a tecnologia
também desperta preocupações e críticas, já que poderia ser utilizada,
teoricamente, para monitorar momentos de descanso de empregados ou os trajetos
feitos por seus usuários, incluindo locais mais frequentados e hábitos de
consumo.
Para que esse tipo de
monitoramento fosse possível, entretanto, o chip subcutâneo precisaria ter um
dispositivo de GPS - algo que não está presente na versão instalada nos
funcionários da empresa de tecnologia.
Pelo menos por
enquanto. "Nós já desenvolvemos toda a tecnologia de um GPS alimentado
pela energia do corpo. Agora estamos trabalhando para reduzir o tamanho do
dispositivo até que seja possível implantá-lo", diz Westby à BBC Brasil.
Tornozeleiras.
O empreendedor diz
que, num futuro próximo, a tecnologia poderá ser usada para substituir
documentos, fichas médicas e até tornozeleiras eletrônicas - bastante
conhecidas no Brasil graças a sentenças recentes da operação Lava Jato.
"As sociedades
estão cada vez mais substituindo o dinheiro vivo por outras formas de
pagamento. O papel também está sumindo. O chip poderá substituir passaportes e
você não vai mais correr o risco de ter o seu roubado ou de perdê-lo. Uma
pessoa com Alzheimer ou doenças de memória poderá ter toda a lista de remédios
que consome detalhada no chip quando for a uma emergência ou visitar um novo
médico", diz.
"As tornozeleiras
eletrônicas existem para monitorar pessoas condenadas, mas são caras e têm
logística difícil. O chip resolveria isso", continua.
Neste ano, pelo menos
cinco estados brasileiros - Goiás, Espírito Santo, Piauí, Alagoas e Rio de
Janeiro - registraram falta de tornozeleiras por excesso e demanda. Em julho
deste ano, o ex-assessor do presidente Michel Temer Rodrigo Rocha Loures
(PMDB-PR), flagrado com uma mala com R$ 500 mil, foi alvo de investigação por
supostamente ter "furado a fila da tornozeleira".
O ex-ministro Geddel
Vieira Lima, que teve prisão preventiva decretada por suposto envolvimento em
corrupção, teve sua liberação para o regime semi-aberto atrasada também pela
escassez do equipamento.
A empresa de Wetsby,
um economista que migrou para a industria da tecnologia em 1997, é a primeira
de que se tem conhecimento nos EUA a implantar chips em funcionários.
Agora, com seis
patentes diferentes em processo de registro, ele quer vender a tecnologia para
diferentes setores.
Brasil.
"Dois hospitais
brasileiros já nos procuraram querendo experimentar a tecnologia", diz o
executivo à BBC Brasil.
Wetsby se limita a
dizer que um deles está em São Paulo, mas não revela nomes "porque as
negociações ainda estão em andamento".
Segundo Westby,
médicos brasileiros estariam interessados em realizar testes com o chip em
pacientes com doenças degenerativas. O chip reuniria informações sobre o
histórico médico dos pacientes, incluindo registros de medicamentos e
tratamentos realizados nos últimos anos e poderia garantir um acesso fácil a
estas informações em caso de confusão mental ou se o paciente estiver
desacordado.
"O Brasil será
nosso próximo mercado. Sei que vocês também têm uma demanda muito grande no
sistema penal", diz o CEO. "Também estamos conversando com Espanha,
Canadá, México e outros lugares."
A reportagem
questiona se a implantação dos chips nos funcionários não foi uma estratégia de
marketing, já que garantiu visibilidade à empresa e abriu as portas para
interessados na tecnologia. Westby jura que não.
"Zero marketing,
você acredite ou não. Nós somos uma empresa de tecnologia. Achamos que seria
divertido fazer esse teste, ficamos empolgados e os funcionários também.
Mandamos, claro uma divulgação para a imprensa como fazemos sempre, mas não sabiamos
que causaria uma comoção tão grande."
O lançamento da
tecnologia, em 1º de agosto, reuniu dezenas de equipes de TV na pequena cidade
de River Falls, de 15 mil habitantes.
Entre os
entrevistados estava uma funcionária que não aceitou receber o chip.
"Eu ainda não vi
pesquisas sobre os efeitos a longo prazo na saúde. Isso me deixa um pouco
preocupada. Ainda é um objeto estranho sendo colocado em seu corpo", disse
a executiva de marketing Katie Langer em entrevista à NBC News.
Futuro.
O chip usado pela
empresa já permite que funcionários se identifiquem em catracas e roletas,
utilizem computadores e máquinas de fotocópias e paguem por produtos consumidos
na cantina. O chip funciona a uma distância máxima de 15 centímetros dos
leitores.
Segundo o criador,
ele pode ser removido em poucos minutos com ajuda de um médico ou enfermeiro -
da mesma forma com que foram inseridos.
As principais
preocupações dos usuários se referem a privacidade - quem garante que o chip
não pode ser hackeado ou os dados que coleta podem ser utilizados por patrões
sem o consentimento dos empregados?
"A tecnologia
que estamos usando é passiva. Não tem GPS, portanto o hackeamento é
impossível", responde o empresário.
A reportagem lembra
que ele havia dito há pouco que está desenvolvendo uma versão com GPS.
"Sim, mas até que tenhamos a tecnologia 100% segura, ela não será
lançada", responde.
Os usos do chip
subcutâneo, segundo seu criador, poderiam incluir monitoramento de crianças em
regiões com alta incidência de tráfico infantil ou de animais domésticos, cuja
fugas poderiam ser evitadas ou controladas.
Em 2015, um boato de
que a então presidente Dilma Rousseff implantaria chips nos brasileiros para
substituir documentos como RG e CPF foi o assunto mais buscado no país pelo
Google durante semanas.
A informação era
falsa. Dilma não havia sancionado ou discutido qualquer lei sobre microchips -
mas discutia a criação de um novo cartão chamado Registro de Identidade Civil,
que possuiria um chip como os presentes em bilhetes de ônibus ou cartões de
crédito.
Para Wetsby, a
comoção ocorrida à época no Brasil deixará de ocorrer em alguns anos.
"As pessoas se
preocupavam com dados pessoais na internet e hoje fazem questão de
compartilhá-los para receberem indicações de sites e produtos que têm a ver com
seu perfil. Todo mundo ficou chocado com o GPS do iPhone e hoje gosta quando o
telefone recomenda trajetos mais inteligentes. No futuro, com os chips, será a
mesma coisa: os que hoje se preocupam vão querer tê-lo para conseguir acesso rápido
a produtos customizados e ter mais segurança do que com papéis ou documentos
que podem perder."
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