Ela é sensível a níveis de luz que variam 100 trilhões de
vezes em intensidade, da escuridão quase completa ao clarão da areia de uma
praia ensolarada; vem com um sistema de autofoco que trabalha impecavelmente
por cerca de quatro décadas e ainda sabe fazer ajustes locais no contraste, de
modo que nenhuma parte da imagem ficará queimada quando outra ainda estiver
escura.
Mais do que isso: entrega o resultado já pré-processado,
limpo e filtrado, com cores corrigidas, e tem resolução ultraelevada na parte
mais importante da imagem. Conta ainda com uma capa que fecha automaticamente
ao menor risco de arranhão.
Que câmera é essa? Sua retina, no fundo de cada olho. Como
se não bastasse, ela ainda vem com um relógio interno embutido, que ajusta a
sensibilidade do detector de acordo com a hora do dia mas também a luminosidade
do ambiente.
Assim como comparar o cérebro a um computador não faz jus à
biologia, que com o tempo torna o cérebro cada vez mais ajustado ao que de fato
faz em cada usuário, ainda está para ser criada uma câmera que seja páreo para
o par que trazemos na cabeça (que, por ser um par, ainda permite visão
estereoscópica, em 3D).
Também, pudera: tecnicamente, a retina, formada por células
organizadas em dez camadas, é parte do cérebro. Extrovertida para as órbitas
durante o desenvolvimento, é verdade –mas parte do cérebro ainda assim, formada
a partir do mesmo primórdio que dá origem ao hipotálamo, estrutura que controla
a fisiologia do corpo, inclusive a produção de hormônios.
Como parte do cérebro que é, a retina se conecta
diretamente a ele e também tem uma circuitaria digna de córtex cerebral. Muito
mais do que os meros detectores de uma câmera, a retina possui um circuito
interno rico e intricado que leva cerca de 40 milissegundos pré-processando a
informação que chega na forma de luz.
Só então o resultado é informado tanto ao córtex visual,
que permite a formação de uma imagem acessível à consciência, quanto aos
colículos, em outra parte do encéfalo, que reposicionam os olhos ao menor sinal
de movimento, sem que precise se pensar a respeito.
Assim como o estado normal do cérebro é alternadamente
acordado ou adormecido, dependendo da combinação de moduladores que o banham,
também a retina recebe do seu irmão, o hipotálamo, fibras com histamina, as mesmas
que mantêm o cérebro acordado. Só falta agora alguém descobrir que a retina não
só se cobre com as pálpebras à noite como ainda dorme...
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